quinta-feira, 7 de maio de 2009

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Seminário 8 - A Hora e a Vez de Augusto Matraga
A Hora e a Vez de Augusto Matraga ou “de como alguém se torna o que é”
Adélia Bezerra de Meneses
Por Pedro Henrique Dias Batista
Adélia Bezerra de Meneses faz, neste texto, uma interpretação minuciosa do conto de Guimarães Rosa, explicitando os papéis de cada personagem, a relação entre os nomes das personagens e estes papéis e outros traços significativos presentes no conto.
O intuito aqui é discorrer sobre a visão da autora com relação ao símbolo tatuado pelos capangas do Major Consilva na “polpa glútea” direita de Nhô Augusto, após seu espancamento. O interessante é perceber que a figura tatuada, um triângulo inscrito em uma circunferência, possui um grande valor simbólico.
Inicialmente, extrai-se uma relação deste símbolo com a trindade cristã (o Pai, o Filho e o Espírito Santo), o que possui uma relação direta com a personagem principal, que passa de uma anomia religiosa para uma situação de grande sofrimento, simbolizando a purgação dos pecados e a mudança para uma conduta correta sob o ponto de vista religioso, honrando a honestidade, o trabalho e a justiça (sob o ponto de vista da religião católica, tomando por base o amor ao próximo) ao invés de violência e egoísmo.
Consta ainda no conto que Matraga saberá “transformar sua marca de ignomínia em marca de pertença”, evidenciando que a vida anterior à marca seria um período perdido, um período de maldades que não honra sua condição humana e no qual não há qualquer diretriz valorativa religiosa. No período posterior à marca, porém, Augusto Matraga carrega a marca como o símbolo de sua força de superação, de sua mudança e da inclusão de valores em seu existir. A marca, portanto, significaria o momento da transformação.
Na busca pelo significado do nome “Matraga” e sua relação com a figura tatuada, a autora remete ao matraz, que consiste em um vaso utilizado para operações alquímicas, como destilação, por exemplo. Como se sabe, alquimia não significa somente a transformação em ouro, mas também a transformação elementar, anímica, de todo um processo existencial, significando uma tendência do objeto a ser como realmente é, ou seja, a exposição dos traços evidenciados pelo destino. Esta descrição é adequada perfeitamente à condição em que se encontra Augusto Matraga, uma vez que este realmente experimenta uma transformação alquímica, transformando-se a essência anterior em um acessório elementar da essência posterior, existindo assim, praticamente, um renascimento (daí a ressurreição relacionada a Jesus Cristo e a purgação dos pecados humanos).
O processo de recuperação de Nhô Augusto, considerando a descrição de suas feridas e sofrimento quando está aos cuidados de Pai Serapião, também possui relação com os processos alquímicos de transformação. Assim, a putrefação de Augusto Matraga é elemento condizente com a purgação e a putrefação alquímica, a qual culmina com sua transformação existencial.
É importante lembrar que Matraga sofre uma mudança. Nada escapa para fora ou se mistura à essência. Tudo é uma transformação elementar que busca “tornar o ser o que ele é” (discutiremos isto no próximo texto, o qual abordará a relação entre o processo existencial constante de Nietzsche e o descrito no conto de Augusto Matraga). O novo ser, fruto do renascimento, portanto, é novo somente no seu sentido externo, tomando por base os valores ou a perfeição, por exemplo, mas intrinsecamente possui como elementos essenciais aqueles já existentes outrora.
Conclusivamente, a autora discorre ainda sobre o kairós, que é o momento astrológico oportuno da alquimia, no qual as coisas se farão. No conto, este momento é dado na luta final entre Nhô Augusto e Joãozinho Bem-Bem, no qual o primeiro tem sua “áurea hora”, sua “aurora”. Este momento representa a hora e a vez de Augusto Matraga, significando a realização do que tem que ser realizado, o kairós de Augusto Matraga. Não à toa, as palavras usadas para definir a personagem principal ao longo do conto é “Nhô Augusto”, mas no final ele é denominado “Matraga”, o que leva ao reencontro de sua identidade e à sua autorrealização.

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